A teoria de Darcy Ribeiro pode estar sendo provada agora

Existem muitas análises que abordam a história do Brasil e a formação do seu povo, pelo prisma de muitas ciências, como a história, a geografia, a antropologia, a sociologia, entre outras, com diversos focos, seja pelo processo histórico de formação política, geográfica, econômica ou de construção do povo, mas todas apontam que o país teve formação atrasada e que o povo foi explorado.

O antropologista Darcy Ribeiro, por exemplo, descreveu que talvez fosse função do Brasil reinventar a lógica vigente na humanidade, pois o país demorou em se incorporar ao capitalismo e, devido as sua multiplicidade étnica e extensão geográfica, nunca conseguiu aplicar um projeto que atingisse todo o território nacional, ademais, segundo Ribeiro, nossas complexidades nos tornavam peculiares em detrimento ao restante do mundo.

Sendo o capitalismo um processo falho, e tendo o Brasil um capitalismo tardio, num momento em que o mundo já vivia as primeiras experiências socialistas, o país começou a se industrializar. Foi neste momento em que se acentuou um processo de desenvolvimento fragmentado, reflexo do processo de colonização do país, que se intensificou no processo de desenvolvimento industrial.

Praticamente, somente a região sudeste foi contemplada pela industrialização, com poucas exceções e isto acentuou as já existentes desigualdades regionais. Enquanto as primeiras montadoras automotivas se instalavam em São Paulo nos anos 1960, principalmente na região do ABC paulista, o nordeste passava por mais uma década de ostracismo desenvolvimentista, por exemplo.

    O antropólogo sugeriu que fosse função do Brasil reinventar o mundo 

Mudança de rumo

“As causas desse descompasso devem ser buscadas em outras áreas. O ruim aqui, e efetivo fator social do atraso, é o modo de ordenação da sociedade, estruturada contra os interesses da população, desde sempre sangrada para servir a desígnios alheios e opostos aos seus. Não há, nunca houve, aqui um povo livre, regendo seu próprio destino na busca da sua própria prosperidade. O que houve e o que há é uma massa de trabalhadores explorada, humilhada e ofendida por uma minoria dominante, espantosamente eficaz na formulação e manutenção do seu próprio projeto de prosperidade, sempre pronta a esmagar qualquer ameaça de reforma de ordem social vigente”. (Ribeiro, 1995).

Após 21 anos de ditadura militar, o Brasil voltou à democracia. Três anos depois, em 1988, entrou em vigor a nossa oitava constituição federal, a mais plural de todas, pois, durante os anos de chumbo, todas as correntes de pensamento contrarias ao regime de extrema direita vigente uniram-se por uma causa em comum: a democracia.

Isto resultou num processo com múltiplas vozes, pois o congresso constituinte (86-89) contemplava todas as vozes que lutaram contra a ditadura, além de vozes que integravam o regime militar, em minoria. O resultado foi uma das constituições mais progressistas do ocidente.
Mas isto não significava que a elite havia sido vencida, pois o fim do regime militar se deu numa correlação de forças e no esgotamento da musculatura da força política dos militares, resultado de décadas de combatividade de democratas liberais e comunistas pelo fim do regime.

Ou seja, apesar dos avanços institucionais, o Brasil ainda padecia de suas mazelas históricas. Passou por um presidente que era uma dissidência do regime ditatorial, por um presidente que sofreu impeachment, por outro que quis trazer novas ideias, elegeu um intelectual que ostentava o título de grande condutor da estabilidade econômica e, até 2002, ainda era tido como um país com muita capacidade, mas, também, muito errante por sua população e pelo resto do mundo.

Apesar dos avanços, a impressão que se tinha é de que pouco havia chegado à população, que as mudanças haviam atingido somente a institucionalidade. Em 2002, após perder as eleições, o ex-metalúrgico Luis Inácio Lula da Silva chegou ao poder, eleito pelo seu partido, o PT, mas sustentado por uma coalizão de forças bastante heterogênea.

Lula governou durante oito anos, num governo cheio de contradições, mas que, inegavelmente, trouxe, sobretudo aos menos abastados, avanços que pareciam inatingíveis no passado, e conseguiu, mais um feito difícil de pensar no passado, no qual conseguiu fazer com que uma mulher fosse sua sucessora.

Neste sentido, talvez, a teoria de Darcy Ribeiro tenha se firmado, pois o Brasil, com toda a sua multiplicidade, só pode ser compreendido por uma figura que sintetizasse todas essas diferenças, um trabalhador brasileiro, dizendo ao mundo que o início das soluções de todos os países está, e sempre estará, no povo. Ainda restam muitas mazelas, mas é notório que ser brasileiro agora é motivo de orgulho por muitos motivos e não apenas pelos motivos de sempre. O horizonte nunca foi tão promissor.  

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